quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Não corra

Se eu pudesse dar um único conselho à você que está lendo este texto, seria esse: NÃO CORRA.
Acredite em mim, não corra.
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Correr é um ato de loucura.
Se você começar a correr vai perceber isso, seu corpo vai doer, suas pernas vão cansar, seus pulmões irão sentir a gana desesperada por mais e mais oxigênio, suas mãos ficarão pesadas, aparecerão assaduras no seu corpo, seus pés serão maltratados, você terá bolhas e algumas unhas irão cair.
Não corra.
Acredite em mim, se você começar a correr, vai perder as baladas de sábado à noite com os amigos e, num inverno qualquer, você vai acordar às 4h da manhã, vai comer uma porção de massa integral cozida apenas na água, sem sal, sem molho. Vai sair de casa no frio com uma temperatura de 5°, sentirá o ar gelado entrar pelos seus pulmões, sua pele vai arrepiar e, ainda assim, não terá vontade de voltar para cama.
Não corra.
Não seja como esses doidos que percorrem ruas, calçadas, parques e trilhas, respirando ofegantes, carregando garrafas com água, sugando pequenos sachês de gel de carboidrato, com viseiras coloridas, fones nos ouvidos e relógios controladores de tempo e distância.
Não seja mais uma pessoa que sai por aí correndo sem destino, enquanto passa por carros parados em sinaleiras ou por ônibus lotados.
Me diga, quem em sã consciência trocaria o ar condicionado do carro ou o assento de um ônibus por uma corrida ao ar livre, com vento no rosto?
Não corra.
Correr é um vício perigoso.
Você vai começar a falar uma linguagem estranha, seu vocabulário será inundado de paces, longões, caixote, km, fartlek, altimetria, regenerativo, canelite, endorfina, seus amigos e familiares não entenderão quando você falar que “quebrou naquela prova”, e ficarão apavorados quando você disser que “ deu 12 tiros no treino de ontem”.
Quando você menos perceber, seu roupeiro terá mais shorts, calções e camisetas do que roupas de “pessoas comuns”. As paredes da sua casa não terão mais quadros com lindas paisagens, estes darão lugar a medalhas com fitas coloridas e pedaços de papel com números aleatórios que mais parecerão fórmulas de física quântica, aos olhos das suas visitas.
Mulheres que correm trocam a busca pelas medidas de miss, os famosos 90/60/90, por números estranhos, elas querem 5, 10, 21 e 42, alguém entende?
Corredores são pessoas estranhas, que comem sem medo, bebem sem culpa, que correm dezenas de provas durante um ano, não ganham nenhuma, mas festejam cada uma delas como uma conquista olímpica.
Corredores são loucos, confie em mim.
Não corra.
Correr vai te trazer a sensação de que você é capaz de ir sempre mais além. Correr vai fazer você conhecer pessoas loucas que começaram a correr e se tornaram viciadas, daqueles que se amontoam atrás de um pórtico de largada, que falam com desconhecidos no meio de uma corrida. E veja só, eles ajudam estranhos, incentivam pessoas que nunca viram antes a continuar correndo, estes viciados não deixam os outros largarem do vício assim, em meio a uma prova, eles te estimulam a querer sempre mais e mais…ah, como são malvados estes viciados.
Não corra.
Corredores são pessoas incomuns, eu diria até perigosas.
Corredores falam com estranhos, fazem conhecidos em cada treino, se reúnem aos domingos às 7h da manhã para correrem em grupo, brincam de dar tiro, colecionam medalhas, possuem um corpo magro, uma mente saudável, fazem amigos de infância a cada prova que disputam.
Ouvi dizer que corredores são pessoas que sorriem demais, que se alegram com pequenas vitórias pessoais, que incentivam desconhecidos.
Corredores são pessoas felizes, e isso , ahhhh…isso é um grande perigo para a sociedade.
Então, acredite em mim, não corra.
Não corra o risco de se tornar um viciado incurável ou uma pessoa que possui a felicidade genuína…não corra o risco de se tornar alguém melhor a cada dia.

Autoria de Fátima Danielle Cosme

Fonte: https://faladanielle.wordpress.com/2015/12/09/nao-corra/?blogsub=confirming#subscribe-blog

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